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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

 

© 2011 India Grey. Todos os direitos reservados.

DESEJOS PROIBIDOS, N.º 1393 - Junho 2012

Título original: Craving the Forbidden

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em portugués em 2012

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

™ ®, Harlequin, logotipo Harlequin e Sabrina são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-0316-9

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversion ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Capítulo 1

 

 

«Senhoras e senhores, bem-vindos a bordo do comboio com destino a Edimburgo. O comboio efetuará paragens em Peterborough, Setevenage...»

Sophie apoiou-se contra a porta do comboio e deixou escapar um suspiro de alívio. Tinha conseguido apanhá-lo a tempo, apesar da mala volumosa que trazia consigo.

No entanto, o seu alívio era relativo, pois ainda usava o vestido de cetim preto, diminuto, que mal escondia o traseiro e as botas altas, de salto alto, que usara para fazer um casting para um filme de vampiros. Mas o mais importante era que apanhara o comboio a tempo e assim não deixaria Jasper abandonado. Quanto ao seu aspeto, não ia ter outro remédio senão deixar o casaco vestido para que não a prendessem por atentado ao pudor, embora estivesse frio suficiente para não querer tirá-lo. Há semanas que não parava de nevar. O mesmo acontecera em Paris. Há dois dias, quando deixara o seu apartamento alugado, uma camada grossa de gelo cobria as janelas por dentro.

Já estava a anoitecer. Pensou que devia procurar uma casa de banho para mudar de roupa, mas sentia-se muito cansada. Pegou na mala e entrou no vagão mais próximo. Sentiu um aperto no coração ao verificar que estava cheio de gente. Avançou pelo corredor, desculpando-se pelos incómodos que podia causar com a sua mala enorme e passou para o vagão seguinte. Também estava cheio e aconteceu o mesmo nos próximos, até chegar a um que tinha menos pessoas. Sentiu um alívio momentâneo, que desapareceu imediatamente quando viu um cartaz que dizia «primeira classe».

A maioria dos lugares estava ocupado por homens de negócios, que não se incomodaram em desviar o olhar dos computadores ou jornais quando passou ao seu lado. Até o seu telemóvel tocar. Enquanto segurava a mala com uma mão, tentou tirar o telemóvel do bolso com a outra, consciente de que todos os olhares se tinham virado na sua direção. Desesperada, pousou a mala na mesa mais próxima e tirou o telefone a tempo de ver o nome de Jean Claude no ecrã.

«Há dois meses, teria tido uma reação muito diferente.» pensou, enquanto carregava no botão para rejeitar a chamada. Mas, há dois meses, a imagem de Jean Claude, como artista parisiense de espírito livre ainda estava intacta. Parecera-lhe tão distante quando o conhecera na filmagem a que levara as suas pinturas... Distante e sofisticado. Nunca teria imaginado que poderia ser tão cansativo e possessivo...

Mas não estava disposta a perder tempo a pensar na sua última aventura romântica.

De repente, sentiu-se tão cansada que decidiu ocupar o banco mais próximo. No banco da frente, havia um homem de negócios escondido por detrás de um jornal grande, que dobrara cuidadosamente, deixando a página dos horóscopos virada para Sophie. De facto, o homem não estava totalmente escondido. Sophie conseguia ver as mãos fortes, morenas, de dedos longos. «Não parecem ser as mãos de um homem de negócios», pensou, distraída, enquanto procurava no jornal o signo balança. «Se quer dar uma boa impressão, prepare-se para trabalhar arduamente. A lua cheia do dia vinte significará uma oportunidade perfeita para permitir que os outros vejam como é realmente.»

Diabos! Aquele dia era precisamente o dia vinte. E embora estivesse disposta a fazer uma interpretação digna de um Óscar para impressionar a família de Jasper, a última coisa que queria era que vissem a verdadeira Sophie.

Naquele momento, voltou a tocar o seu telemóvel. Gemeu. Porque é que Jean Claude não a deixava em paz de uma vez? Ia rejeitar a chamada quando uma sacudidela do comboio a fez carregar involuntariamente no botão para aceitar a chamada. Um segundo depois, a voz de Jean Claude chegou claramente aos seus ouvidos... E aos do resto dos passageiros.

– Sophie? Onde estás...?

Sophie interrompeu-o rapidamente.

– Chegou ao correio de voz de madame Sophie, astróloga e leitora de cartas – disse, enquanto observava o seu reflexo na janela do comboio. – Se deixar o seu nome, número de telefone e signo do Zodíaco, entrarei em contacto consigo para o informar do que lhe proporciona o destino...

Interrompeu-se bruscamente e sentiu uma espécie de descarga elétrica ao perceber que estava a olhar diretamente para os olhos refletidos no vidro, do homem que estava sentado à sua frente. Embora, na verdade, fosse ele que a observava. Por uns instantes, foi incapaz de fazer outra coisa senão olhar também. Tal como as mãos, a pele morena do homem contrastava com a sua camisa branca, algo que, por algum motivo, não encaixava com o seu rosto ascético e severo. Era o rosto de um cavalheiro medieval numa pintura, bonito, distante...

Por outras palavras, não era o seu tipo.

– Sophie? És tu? Mal te ouço. Estás no Eurostar? Diz-me a que horas chegas e irei buscar-te à Gare du Nord.

Sophie esquecera-se por completo de Jean Claude. Teve de fazer um esforço para desviar o olhar do reflexo da janela. Devia falar com clareza. Caso contrário, Jean Claude não deixaria de a incomodar durante o fim de semana que ia passar com a família de Jasper, o que arruinaria a sua imagem de namorada doce e entusiasmada.

– Não estou no Eurostar – disse, com cautela. – Não vou voltar esta noite.

– Então, quando tencionas voltar? O quadro... Preciso de te ter aqui... Preciso de ver a tua pele, senti-la, para captar o contraste com as pétalas de lírio...

«Nu com lírios» fora a visão que Jean Claude alegara ter tido quando reparara nela num bar em Marais, perto do local onde estavam a filmar. Jasper, que fora passar o fim de semana com ela, pensara que era muito engraçado. Sophie, adulada pelos elogios extravagantes de Jean Claude sobre a sua pele de «pétalas de lírio» e o seu «cabelo em chamas» pensara que ser retratada seria uma experiência muito erótica.

A realidade fora extremamente fria e aborrecida. Ainda que, se o olhar de Jean Claude tivesse causado nela uma reação semelhante ao do homem refletido na janela, a história pudesse ter sido muito diferente...

– Porque não pintas mais umas pétalas para cobrir a pele? – reprimiu um risinho e continuou a falar com mais delicadeza. – Não sei quando voltarei, Jean Claude, mas o que tivemos não foi nada duradouro, não te parece? Na verdade, foi apenas sexo...

Naquele momento, o comboio entrou num túnel e perdeu-se o sinal. Por um instante, Sophie viu novamente os olhos do homem na janela e soube que estivera a observá-la. Um instante depois, saíram do túnel e não conseguiu ver a expressão do seu rosto, mas sabia que era de desaprovação.

Naquele momento, voltou a ter oito anos e viu-se a segurar a mão da mãe, consciente de que as pessoas as observavam e julgavam. A velha humilhação cresceu no seu interior, enquanto ouvia na sua cabeça a voz indignada da mãe. «Ignora-os, Summer. Temos tanto direito como qualquer outro de estar aqui.»

– Sophie?

– Lamento muito, Jean Claude – disse, repentinamente apagada. – Não posso falar disso agora. Estou no comboio e o sinal não é bom.

D’accord. Ligo-te mais tarde.

– Não! Não podes ligar-me durante todo o fim de semana. Estou... A trabalhar e sabes que não podemos atender chamadas durante as filmagens. Eu telefono-te na segunda-feira, quando voltar para Londres. Falaremos então – acrescentou, antes de desligar.

Mas, na verdade, não havia nada para dizer. Jean Claude e ela tinham-se divertido, mas isso era tudo: diversão. Uma aventura romântica em Paris. Chegara à sua conclusão natural e era hora de seguir em frente.

Mais uma vez.

Olhou pela janela. Começara a nevar novamente e as casas junto das quais circulava o comboio eram especialmente acolhedoras no meio daquela paisagem invernal. Imaginou as pessoas que as habitavam, sentadas à frente do televisor, conversando, partilhando algo para beber, unidas face ao frio mundo exterior.

Aquelas imagens confortáveis eram deprimentes. Ao regressar de Paris descobrira que, na sua ausência, o noivo da sua companheira de apartamento se mudara para lá e a casa transformara-se no escritório central da Sociedade de Casais Felizes. O ambiente de companheirismo a que se habituara com Jess desaparecera. O apartamento estava imaculado, havia novas almofadas no sofá e velas na mesa da cozinha.

A chamada de socorro de Jasper, a pedir-lhe para ir à casa da sua família em Northumberland, para se fazer passar pela sua namorada durante o fim de semana, fora um autêntico alívio. «Mas as coisas seriam assim» pensou, com tristeza, enquanto o comboio continuava a avançar. Todos tinham um parceiro e ela era a única que continuava sem querer uma relação séria, um compromisso autêntico. Até Jasper estava a mostrar indícios preocupantes disso, à medida que a sua relação se tornava mais séria com Sérgio.

Mas porque havia de ser sério, se podiam divertir-se?

Sophie levantou-se, pegou na mala e pô-la no bagageiro. Não foi fácil e, enquanto o fazia, percebeu que o seu vestido se levantava ao mesmo tempo que o casaco se abria, oferecendo ao homem sentado à frente dela a visão de uma quantidade indecente de coxa. Envergonhada, olhou para o seu reflexo no espelho.

Não estava a olhar para ela. Tinha a cabeça apoiada contra o banco e a sua expressão continuava a parecer especialmente remota, enquanto concentrava o olhar no jornal. Sophie fechou o casaco e, ao voltar a sentar-se, tocou involuntariamente com o joelho na coxa do homem por baixo da mesa.

Ficou paralisada enquanto algo parecido com uma chuva de faíscas cintilantes percorria o seu corpo.

– Lamento – murmurou, enquanto afastava as pernas.

O jornal desceu devagar e Sophie deu por si a olhar diretamente para o seu companheiro de viagem. O impacto de encontrar o seu olhar no reflexo do vidro já fora bastante intenso, mas olhar para ele diretamente era como receber uma descarga elétrica. Os seus olhos não eram castanhos, como imaginara, mas da cor cinzenta dos mares frios do norte, emoldurados por pestanas grossas e escuras, suficientemente absorventes para a distrair por um momento do resto do seu rosto.

Por fim, sorriu.

Foi um sorriso fantasma, que não bastou para derreter o gelo do seu olhar, embora atraísse a atenção de Sophie para a sua boca...

– Não faz mal. Embora fosse de esperar que, viajando em primeira classe, houvesse espaço suficiente para as pernas.

A voz do homem era grave, rouca e tão sensual que Sophie devia ter-se animado face à perspetiva de passar as próximas quatro horas na sua companhia. No entanto, a ênfase ligeiramente desdenhosa com que pronunciara a palavra «classe» e a forma como olhava para ela, como se fosse uma larva na salada, anulou a sua beleza.

Sophie tinha problemas com as pessoas que olhavam para ela assim.

– Totalmente de acordo – assentiu, com a típica segurança em si própria. – É realmente escandaloso – acrescentou e, depois de levantar a gola do casaco, acomodou-se no banco e fechou os olhos.

 

 

Kit Fitzroy largou o jornal.

Normalmente, quando estava de licença evitava ler notícias sobre a situação que deixara para trás. O calor, a areia e o desespero não se viam nas colunas estéreis a preto e branco da imprensa. Tinha comprado o jornal para ler coisas normais, como os resultados dos jogos de rugby e as notícias sobre as corridas mas, para tentar afastar da sua mente a imagem da rapariga que se sentara à frente dele, acabara por ler o jornal todo.

Mas isso não tinha funcionado. Nem sequer o artigo ridiculamente errado sobre as operações antiterroristas no Médio Oriente lhe servira de distração.

«Embora não seja de estranhar», pensou com ironia. Passara os quatro últimos meses isolado no deserto, com uma companhia formada totalmente por homens e ainda era suficientemente humano para reagir a uma rapariga com sapatos de salto alto e um vestido diminuto sob um casaco de estilo militar. Sobretudo se, além disso, a rapariga tivesse a voz sensual de uma cantora de clube noturno e dissesse ao parvo que estava do outro lado da linha do seu telemóvel que a única coisa que procurara fora um pouco de sexo.

Depois da cerimónia sombria a que acabara de assistir, o aspeto daquela rapariga era como uma injeção de uma coisa muito potente.

Reprimiu um sorriso irónico.

Potente sim, embora não especialmente sofisticado.

Olhou para ela novamente. Adormecera com a rapidez de um gato, com as pernas dobradas no banco e um sorriso ligeiro nos seus lábios rosados, como se estivesse a sonhar com algo divertido. Tinha os olhos fechados, mas ainda recordava a sua cor verde-clara.

Mas não sabia se estava realmente a dormir. O radar de Kit Fitzroy no referente a possíveis enganos era muito sensível e aquela rapariga alarmara-o desde que aparecera no vagão. No entanto, havia algo nela que o convencera de que não estava a fingir, não só por estar tão quieta, mas porque toda a energia desaparecera. Era como se se tivesse apagado uma luz ou o sol se tivesse posto.

O sono era a recompensa do inocente. Dada a falta de vergonha com que acabara de mentir ao namorado, não parecia justo que pudesse dormir tão placidamente. Sobretudo, quando o sono o evitava com tanta crueldade.

– Bilhetes, por favor.

O torpor que parecia ter-se apropriado do vagão desapareceu com a chegada do revisor. Houve uma onda de atividade, enquanto todos os passageiros tiravam as carteiras ou procuravam dinheiro nos bolsos. Do outro lado da mesa, as pestanas da jovem nem sequer se mexeram.

Kit pensou que devia ter cerca de vinte e cinco anos, embora houvesse algo curiosamente infantil nela... Pelo menos, se se ignorasse a curva generosa dos seus seios contra o corpete de renda do seu vestido preto.

E ele estava a fazer verdadeiros esforços para o ignorar.

Quando o revisor chegou junto dele, franziu o sobrolho ao ver que Sophie estava a dormir. Estendeu uma mão com a intenção de a acordar.

– Não!

O revisor virou-se, surpreendido. Embora não fosse o único. Kit não entendia porque reagira assim.

– Não se preocupe – acrescentou. – Está comigo.

– Lamento muito, senhor. Não me tinha apercebido. Tem o seu bilhete?

– Não – Kit abriu a carteira. – Tinha... Tínhamos planeado viajar até ao norte de avião.

– Compreendo, senhor. O mau tempo fez com que se suspendessem vários voos. É por isso que o comboio está tão cheio esta tarde. Quer o bilhete de ida ou de ida e volta?

– De ida e volta, por favor – com um pouco de sorte, os aeroportos voltariam a abrir no domingo, mas Kit não queria correr nenhum risco. A perspetiva de se ver preso indefinidamente em Alnburgh com a sua família era insuportável.

– Duas idas e voltas para Edimburgo?

Kit assentiu distraidamente e voltou a olhar para a sua companheira de viagem, enquanto o revisor imprimia os bilhetes. Tinha a certeza de que ela não tinha bilhete de primeira classe e que, apesar do seu sotaque quase convincente de classe alta, não tencionava comprar um. De maneira que, porque não deixara que o revisor a acordasse? O resto da viagem teria sido mais confortável, mais relaxado.

Kit Fitzroy acreditava sinceramente no seu dever de proteger as pessoas que não tinham os mesmos privilégios que ele. Fora isso que o impulsionara a acabar a sua preparação como oficial e o que o mantinha sensato quando se sentia exausto durante as patrulhas ou quando se encaminhava por uma estrada deserta, para uma bomba por explodir. Normalmente, não o impulsionava a comprar bilhete de primeira classe para desconhecidas num comboio. Além disso, aquela rapariga tinha aspeto de ser perfeitamente capaz de cuidar de si própria.

Mas com a sua roupa escandalosa, o seu cabelo e o seu leve ar travesso animara-lhe a viagem. Fizera-o sair do estado deprimente em que se encontrava depois do funeral a que acabara de assistir e, além disso, fizera-o esquecer o fim de semana que o esperava. Só por isso, valia a pena pagar o preço de um bilhete de primeira classe para Edimburgo. Mesmo sem a olhadela para o seu decote, nem o toque da sua perna, que o fizera recordar que, apesar de vários dos homens com quem servira não terem tido tanta sorte, ele continuava vivo...