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HarperCollins 200 anos. Desde 1817.

 

Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2006 Penny Jordan

© 2017 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Mestre do prazer, n.º 1059 - maio 2017

Título original: Master of Pleasure

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

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Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-9667-3

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Epílogo

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

 

Sasha virou-se para olhar para os seus filhos gémeos, que pulavam na praia como dois cachorrinhos, lutando e saltando entre as ondas que banhavam a costa solitária da Sardenha.

– Tenham cuidado – avisou e, dirigindo-se ao mais velho, acrescentou: – Sam, não sejas bruto.

– Estamos a brincar aos bandidos – justificou-se ele.

Aquele era o seu jogo preferido daquele Verão, desde que Guiseppe, o irmão de Maria, que trabalhava na cozinha do pequeno hotel que fazia parte da cadeia do falecido marido de Sasha, lhes contara histórias da ilha e dos seus lendários bandidos.

Os meninos tinham herdado o cabelo escuro, espesso e sedoso e a pele bronzeada do seu pai. Dela, só tinham a cor dos olhos, que denunciava a sua dupla nacionalidade. Uns olhos da cor do mar, que passavam do azul ao verde conforme a luz que reflectia neles.

– Disse-te que me soltarias – Nico riu-se, libertando-se com habilidade do braço do seu irmão.

– Tenham cuidado com as rochas! – protestou Sasha enquanto Sam se lançava contra Nico, derrubando-o. Ambos se riram e rolaram sobre a areia.

– Olha, Sam, uma estrela-do-mar – gritou Nico e baixaram-se um ao lado do outro para observar. – Olha, mamã!

Obediente, Sasha aproximou-se dos seus filhos e ajoelhou-se entre eles rodeando-os com os braços.

– Vá, vamos – disse Sam a Nico, já aborrecido com o lago e com os seus habitantes. – Lembra-te de que sou o chefe dos bandidos.

«Crianças», pensou Sasha com melancolia. Porém, o seu coração encheu-se de amor e orgulho ao vê-los correr para uma parte mais segura da praia. Sem deixar de lhes prestar atenção, virou-se para olhar para o hotel, situado sobre um monte escarpado. Aquele era, na sua opinião, o mais bonito de todos os hotéis que o seu falecido marido possuíra. Como presente de casamento, dera-lhe um cheque em branco para empregar na sua renovação. O dinheiro que ela gastara fora recompensado pelos louvores dos hóspedes, que voltavam várias vezes e elogiavam as suas ideias inovadoras e a sua determinação em manter a exclusividade do hotel.

Contudo, quando Carlo morrera, Sasha descobrira com espanto que os outros hotéis do grupo não tinham o mesmo sucesso que aquele. Sem que ela soubesse, Carlo contraíra dívidas enormes com o objectivo de manter o negócio à tona e usara os hotéis como garantia dos empréstimos. Tomara decisões erradas, devido talvez à saúde delicada de Carlo. O seu marido fora um homem amável, generoso e afectuoso, porém, não acreditava nela no que dizia respeito aos seus assuntos financeiros. Para Carlo, ela tinha de ser protegida e mimada.

Tinham-se conhecido nas Caraíbas, onde Carlo estava a estudar a possibilidade de adquirir um hotel para a sua cadeia. Agora, além de sofrer a dor de o ter perdido, tinha de aceitar o facto de, da noite para o dia, ter deixado de ser a esposa de um homem rico para se tornar uma viúva sem um cêntimo. Menos de uma semana depois da morte de Carlo, o seu contabilista dissera a Sasha que o seu marido devia enormes quantias de dinheiro, milhões, de facto, a um investidor privado e anónimo a quem pedira ajuda económica. E, embora ela tivesse suplicado aos assessores financeiros que encontrassem uma forma de ela ficar com aquele hotel, eles tinham-na informado de que o investidor privado não estava disposto a aceder sob nenhuma circunstância.

Sasha voltou a olhar para os seus filhos. Iam sentir saudades da Sardenha e dos maravilhosos verões que tinham passado ali, mas iam sentir muito mais saudades do seu progenitor. Embora fosse um pai já com alguma idade, incapaz de se juntar aos jogos dos seus enérgicos filhos, adorava-os e eles adoravam-no a ele. No seu leito de morte, Carlo fizera com que Sasha prometesse que não esqueceria a importância da Sardenha na vida dos gémeos.

– Lembra-te – dissera-lhe com cansaço – de que tudo o que fiz foi por amor aos meninos e a ti.

Sasha devia tanto a Carlo… Ele dera-lhe tudo. Encarregara-se da menina magoada que ela era na altura e, com amor e compreensão, curara as suas feridas. Dera-lhe presentes que não tinham preço: amor-próprio, independência emocional, a capacidade de dar e receber um amor saudável, carente de dependência destrutiva. Para ela, fora muito mais do que um simples marido.

Os seus olhos brilharam com determinação, adquirindo o tom escuro do interior de uma esmeralda. Fora pobre antes e sobrevivera. Claro que então não tinha de sustentar dois filhos. Nessa manhã, recebera uma mensagem de correio electrónico da escola dos rapazes, onde lhe recordavam discretamente que tinha de pagar o novo trimestre. A última coisa que desejava fazer era causar mais transtorno nas suas jovens vidas afastando-os de uma escola onde eram tão felizes.

Sasha olhou para os seus anéis de diamantes. Nunca quisera ter jóias caras, fora Carlo que desejara que as tivesse. Decidiu que teria de as vender. Pelo menos, os meninos tinham onde viver durante as férias de Verão. Fora humilhante para ela suplicar aos advogados de Carlo que os deixassem ficar ali até que a escola começasse em Setembro. Sasha mostrara-se agradecida quando lhe tinham dito que lhe tinham concedido o seu desejo. A sua própria infância tivera tanta falta de amor e segurança que no momento em que descobrira que estava grávida se prometera que os seus filhos nunca teriam de sofrer como ela sofrera. Por isso…

Sasha virou-se para olhar para os seus filhos. Sim, Carlo conseguira curar muitas das suas feridas; todas menos uma. Uma ferida sentimental, persistente, que ainda não cicatrizara.

A preocupação dos últimos meses consumira-a deixando-a, na sua opinião, demasiado magra. O relógio de pulso dançou no seu pulso enquanto apanhava o cabelo.

Tinha dezoito anos quando se casara com Carlo e dezanove quando os meninos tinham nascido. Sasha, que era uma rapariga sem formação mas inteligente, aceitara a proposta de casamento de Carlo apesar de ele ser muito mais velho do que ela. O seu casamento dera-lhe tudo o que ela nunca tivera e não apenas no que dizia respeito à segurança económica. Carlo dera-lhe também estabilidade e um ambiente seguro.

Ela fizera os possíveis para corresponder à sua amabilidade e, ver a cara de Carlo da primeira vez que este vira os gémeos nos berços do hospital privado em que ela dera à luz, fizera-a compreender de que dera ao seu marido um presente que não tinha preço.

– Olha, mamã!

Sasha, obediente, olhou para os meninos, que davam cambalhotas. Algum dia, disse para si, pedir-lhe-iam que não olhasse tanto para eles. Mas ainda não eram conscientes de como ela estava sempre atenta ao que faziam. Com uns filhos tão inquietos e inteligentes, por vezes era difícil não ser super protectora, a típica mãe que via perigo onde as crianças só viam possibilidades de aventura.

– Que bem! – exclamou ela.

– Olha, também sabemos fazer o pino – exclamou Sam, orgulhoso.

Eram rapazes ágeis e corpulentos, muito altos para os seus nove anos.

– Deste-me uns meninos fortes, Sasha – elogiava-a Carlo com frequência. Ela sorriu, recordando aquelas palavras. O seu casamento proporcionara-lhe o tempo e o espaço necessários para deixar de ser a menina que fora e transformar-se na mulher que era agora. Um raio de sol reflectiu-se no seu fino anel de casamento ao mesmo tempo que ela se virava para olhar para o hotel sobre as rochas.

O seu marido e ela tinham viajado por todo o mundo visitando a cadeia de pequenos e exclusivos hotéis que ele possuía, porém, o seu preferido era o da Sardenha. Originalmente, fora uma residência privada, propriedade de um primo de Carlo que, ao morrer, a deixara como herança. Carlo prometera-se conservá-la para sempre.

 

 

Gabriel, de pé à sombra das rochas, baixou o olhar para a praia. Torceu a boca num gesto de desprezo.

Perguntou-se como ela se sentiria, agora que sabia que o destino estava contra ela e que a segurança que comprara com o seu corpo não ia durar a vida toda. Agora que sabia que não ia ser uma viúva rica e rodeada de comodidades.

Quanto aos meninos… Sentiu o fel correr pelo seu interior, rasgando-o por dentro. Vê-los fizera com que recordasse a sua própria infância ali, na Sardenha. Como poderia alguma vez esquecer a infância cruel e dura que vivera? Com a idade daqueles dois meninos, ele tivera de trabalhar muito arduamente. Os maus-tratos e insultos que sofrera tinham-lhe ensinado a esquivar os golpes da vida. Fora um filho não desejado pela sua família materna rica, abandonado pelo seu pai e criado por uma família adoptiva. Quando era um menino, recordou Gabriel amargamente, passara mais noites a dormir à intempérie com os animais da quinta do que dentro da casa com a família, que sabia do desprezo que a família da sua mãe sentia por ele.

Gabriel pensava que uma infância como aquela ou fortalecia ou estragava o espírito humano e, no seu caso, endurecera-o até o transformar em aço. Nunca permitira nem permitiria que ninguém o afastasse do caminho que escolhera, nem que ninguém se interpusesse entre ele e a sua firme determinação de se situar por cima daqueles que o tinham desprezado.

O seu avô materno fora o patriarca de uma das famílias mais ricas e poderosas da Sardenha. O passado dos Calbrini estava inextrincavelmente unido ao da ilha. Tratava-se de uma família muito orgulhosa e dividida pelo ódio, a traição e a vingança.

A sua mãe fora filha única. Aos dezoito anos, saíra de casa fugindo do casamento que o seu pai arranjara para ela e casara-se com um jovem agricultor, pobre mas bonito, por quem pensara estar apaixonada.

Aquela rapariga teimosa e mimada demorara menos de um ano a dar-se conta de que cometera um erro e de que odiava o seu marido quase tanto como a pobreza em que viviam. Contudo, nessa altura, Gabriel já tinha nascido. Suplicara ao seu pai que a perdoasse e lhe permitisse voltar para casa. Ele consentira, com a condição de que se divorciasse do seu marido e deixasse o menino com o seu pai. Segundo as histórias que tinham contado a Gabriel, a sua mãe não hesitara. O seu avô entregara uma boa quantia de dinheiro ao pai de Gabriel, considerando que esse único pagamento eximiria a família Calbrini de toda responsabilidade para com o fruto do então extinto casamento.

O pai de Gabriel, vendo-se com mais dinheiro de que alguma vez tivera, partira para Roma, deixando o seu filho de três meses aos cuidados de um primo, a quem prometera que enviaria dinheiro para as necessidades do menino. Contudo, em Roma conhecera a mulher que se tornaria a sua segunda esposa, que não entendia porque tinha ela de carregar com um menino que não era dela, nem porque deviam esbanjar o dinheiro do seu marido com ele.

Os pais adoptivos de Gabriel tinham recorrido ao seu avô, pois eram pobres e não podiam permitir-se alimentar um menino faminto. Porém, Giorgio Calbrini recusara-se a ajudá-los. Aquele menino não significava nada para ele. Além disso, a sua filha voltara a casar, dessa vez com o homem que ele escolhera para ela e esperava que em breve lhe desse um neto da linhagem que o seu orgulho exigia.

Mas não o fez e, quando Gabriel tinha dez anos de idade, a sua mãe e o seu segundo marido tinham morrido num acidente de helicóptero. Então, Giorgio Calbrini não tivera outro remédio senão conformar-se com o único herdeiro que tinha: Gabriel.

Fora uma vida austera e desprovida de carinho, recordou Gabriel, com um avô que não o amava e que desprezava o sangue que herdara do seu pai. Mas pelo menos, sob o tecto do seu avô, fora bem alimentado. Este enviara-o para as melhores escolas e certificara-se de que recebia a formação necessária para que, chegado o momento, o sucedesse como patriarca da casa Calbrini. A verdade era que o seu avô não depositara nele grandes esperanças e deixara-o claro muitas vezes.

– Faço isto porque não tenho opção, porque és o único neto que tenho – dissera-lhe amargamente inúmeras vezes.

No entanto, Gabriel estava empenhado em demonstrar-lhe que estava enganado, e não para ganhar o amor do seu avô, visto que não acreditava no amor. Queria demonstrar-lhe que era o melhor, o mais forte. E foi exactamente o que fez. Ao princípio, o seu avô recusara-se a acreditar no que os seus professores diziam sobre o quanto sabia acerca do mundo financeiro. Mas a verdade era que, aos vinte anos, quadruplicara a pequena quantia de dinheiro que o seu avô lhe oferecera quando fizera os dezoito.

Um dia, três semanas depois de fazer vinte e um anos, o seu avô morrera de repente e Gabriel herdara a sua enorme fortuna e posição. Aqueles que tinham dito que Gabriel nunca seria capaz de seguir os passos do idoso tinham tido de engolir as suas palavras. Ele era um verdadeiro Calbrini e possuía um instinto para os negócios talvez até mais sagaz do que o seu avô. Mas para ele havia coisas mais importantes na vida do que ganhar dinheiro. Tinha a necessidade de ser um homem invulnerável sentimentalmente.

E era exactamente isso em que se transformara, reflectiu. Nunca permitiria que nenhuma mulher o rejeitasse como a sua mãe fizera sem receber um castigo.

Especialmente aquela mulher.

Gabriel ouvia Sasha a falar com os seus filhos. A brisa trazia-lhe o som da sua voz, embora não as suas palavras.

Sasha… Com vinte e cinco anos, Gabriel já era milionário. Um homem rico que não confiava em ninguém e que não deixava que as mulheres que escolhia para aquecer o seu leito fossem mais do que isso: simples companheiras de cama. Criara uma série de regras, simples e inegociáveis, sobre como deviam ser as relações. Era proibido falar de amor, do futuro ou de compromisso. Exigia fidelidade incondicional enquanto durasse a relação e respeito absoluto pelo seu princípio de sexo seguro. E, para se certificar de que a última regra não era quebrada «acidentalmente de propósito», Gabriel ocupava-se desse tipo de coisas ele mesmo.

Ao longo dos anos vivera cenas de aborrecimento e amargura protagonizadas por mulheres histéricas que tinham achado erroneamente que conseguiriam fazer com que mudasse. Aquelas lágrimas desapareciam como por arte de magia quando Gabriel lhes oferecia um generoso presente de despedida. A sua boca torceu-se numa expressão cínica. Por acaso era de estranhar que se tivesse tornado um homem desconfiado e, sobretudo, um homem que desprezava as mulheres? Segundo Gabriel, não existia nenhuma mulher que não pudesse comprar. A sua mãe demonstrara-lhe como era o sexo feminino e todas as mulheres com quem lidara depois disso apenas tinham corroborado o que aprendera com a sua mãe quando esta o abandonara por dinheiro.

Isso não queria dizer que não gostasse da companhia das mulheres, ou melhor, do prazer que os seus corpos lhe proporcionavam. Herdara a aparência do seu pai e encontrar uma mulher disposta a satisfazer as suas necessidades sexuais nunca fora um problema.

– Sam, não vás tão longe. Fica aqui, onde eu possa ver-te – dessa vez, as palavras de Sasha chegaram até ele, já que ela elevara a voz para que o seu filho conseguisse ouvi-la. Uma mãe preocupada? Sasha?

Não podia fugir do seu passado. Chegara até ele com tanta força que quase podia sentir dor física.

Depois da morte do seu avô, fechara a solitária casa que o seu avô tinha na Sardenha e comprara um iate. Como investidor imobiliário, tinha de viajar para descobrir possíveis aquisições, tanto materiais como sexuais. E, se alguma mulher o convidava para a sua cama, porque não haveria de ir? Desde que ela compreendesse que uma vez satisfeito o seu apetite, não havia lugar para ela na sua vida…

Com vinte e cinco anos, decidira que, quando o momento certo chegasse, pagaria a uma mulher para que lhe desse um herdeiro: uma criança sobre quem ele teria direitos exclusivos.

Gabriel olhou para Sasha com um desprezo frio. Tinham passado apenas seis semanas, justamente depois do seu trigésimo quinto aniversário, desde que estivera junto do leito de morte do seu segundo primo ouvindo como Carlo lhe suplicava, a ele, que ajudasse os seus dois filhos, que eram quem Carlo mais amava no mundo.

A mesma brisa que brincava sensualmente com a longa cabeleira de Sasha pôs para trás o seu próprio cabelo escuro, deixando a descoberto uma estrutura óssea típica da Sardenha, de nariz recto, romano, uns traços masculinos que recordavam certas esculturas de Leonardo e Miguel Ângelo e uma musculatura de homem jovem e forte. Os sarracenos tinham invadido a Sardenha há séculos, deixando a sua marca na história da ilha e nos seus habitantes através das mulheres que tinham possuído. Foi Carlo quem lhe contara a lenda de que os varões nascidos de tais uniões tinham no sangue a força física e a crueldade lendária dos seus pais. Gabriel sabia que tinha sangue árabe nas veias e que isso se demonstrava na sua atitude diante da vida. Não tinha compaixão por aqueles que o traíam.

Estudou os dois meninos com o olhar vigilante e mortífero de uma águia. Meninos privilegiados, adorados por um pai idoso e afectuoso. Que infância tão diferente da sua. Pensou no que Carlo lhe suplicara: que tratasse dos seus dois filhos, dando a entender que não confiava na sua mãe. No seu leito de morte, Carlo finalmente reconhecia que ela não era de confiar.

Contudo, as últimas palavras que Carlo dirigira a Gabriel tinham sido sobre Sasha.

– Tens de compreender que Sasha… – disse a Gabriel.

A sua fraqueza impedira-o de acabar a frase, mas não foi preciso. Gabriel sabia tudo o que precisava de saber sobre Sasha. Tal como a sua mãe, ela abandonara-o. Recordá-lo não fazia mais do que exacerbar os seus sentimentos sombrios. Ela fora a causa de uma ofensa ao seu orgulho e agora chegara o momento de cobrar a dívida…

O grito de protesto de um dos gémeos fez com que Sasha se virasse para eles, ansiosa.

– Parem de discutir, meninos.

Algo, ou melhor dizendo, alguém se interpusera entre o sol e ela. Pôs a mão à frente dos olhos para ver de quem se tratava.

Havia momentos na vida que aconteciam tão rápida e lentamente ao mesmo tempo que era impossível ignorá-los ou esquecê-los. Sasha sentiu que o seu coração parava e, em seguida, experimentou uma sensação sufocante de incredulidade e terror, algo tão doloroso que nem tentou compreender. Ouviu o ecoar surdo do seu coração ao longe, como se não lhe pertencesse, vagamente consciente de que o sangue corria pelas suas veias, mantendo-a viva, enquanto sentia dor em cada nervo do seu corpo. Não conseguiu dizer mais do que uma palavra:

– Gabriel!

Capítulo 2

 

Uma só palavra, mas tão cheia de raiva e horror que ficou a ecoar no ar. Sasha virou a cabeça para olhar para Gabriel enquanto sentia o pulso a acelerar.

– O que estás aqui a fazer? O que queres?

Fora um erro perguntar-lhe aquilo, pois ele repararia no pânico da sua voz e aperceber-se-ia de que ela estava a tentar sobrepor-se ao medo. Teve a certeza disso pela forma como a boca de Gabriel se torcia num sorriso cruel e satisfeito, que ela recordava tão bem.

– O que achas?

A sua voz soava tão doce e suave como a carícia de um amante. Durante um segundo, o seu corpo reagiu às lembranças que evocava. De repente, voltou para os seus dezassete anos, quando escondia o seu sofrimento e a sua carência emocional sob a aparência de uma mulher segura. Tirara a provocadora minissaia e o minúsculo top e tinha o cabelo loiro encharcado depois do duche que Gabriel fizera com que tomasse. Ele olhava para ela, enquanto ela, aflita pelo sentimento, tinha consciência pela primeira vez na sua vida do que era o desejo físico. Ela amava-o, desejava-o com verdadeira loucura.

Não queria voltar para o passado, mas já era demasiado tarde. Recordou a impaciência que sentira quando, em vez de esperar que ele se aproximasse, ela mesma se equilibrara sobre ele. Ele agarrara-a a alguma distância para poder estudar o seu corpo nu, que já começava a oferecer sinais visíveis de desejo. Os seus seios endureceram ao imaginar o toque dos seus dedos, cuja pele era dura, ligeiramente áspera, a pele de um homem que trabalhava com as suas mãos e não apenas com o seu cérebro. Tremera com uma emoção incontrolável enquanto ele começava a explorar a forma dos seus seios. O erotismo do seu toque áspero fez com que tivesse consciência, de repente, da sua própria excitação, de como se sentia preparada, de como a parte mais íntima do seu corpo estava sensível. E, como se ele o tivesse percebido também, Gabriel começara a percorrê-la com a sua mão, suavemente, mas com determinação. Quando a deixou repousar no protuberante osso da sua anca, ela, invadida pela impaciência, sentira a necessidade de uma carícia mais íntima. Fora ela que se aproximara dele abrindo as pernas ou fora ele que deslocara a mão para a sua coxa? Não o recordava. Mas o que não podia esquecer era o que sentira quando ele inclinara a cabeça para beijar a pele suave do seu pescoço enquanto afundava os seus dedos no centro húmido e quente do seu sexo. Ela estivera prestes a alcançar o clímax nesse mesmo momento.

De repente, sentiu um calafrio. O que fazia a pensar naquilo agora? O que estava a sentir? Medo? Culpa? Nostalgia? Não, nunca. A rapariga que uma vez fora desaparecera e, com ela, tudo o que uma vez sentira.