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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2001 Susan Napier

© 2019 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Proposta apaixonada, n.º 630 - março 2020

Título original: A Passionate Proposition

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-1348-253-8

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Créditos

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

 

 

 

 

 

Para a menina nervosa que se demorava na entrada da sala, a mulher sentada na extremidade da enorme mesa de jantar parecia muito concentrada, com o corpo esguio debruçado sobre um monte de papéis, enquanto a caneta dançava entre os dedos da mão. Muitas folhas estavam espalhadas sobre a mesa, assim como vários livros abertos e uma chávena de chá esquecida ao lado do braço. O candeeiro perto da mesa iluminava o ambiente e a luz amarela sobre a cabeça inclinada ressaltava os cabelos presos junto à nuca, realçando-lhes o tom dourado. Mesmo usando roupas simples e quase sem cor, como a camisa branca e as calças beges, ainda conseguia parecer extremamente feminina.

A senhora Adams era sempre gentil e acessível. Nunca gritava, não tinha alunos favoritos, nem implicava com as crianças por características pessoais que não podiam evitar, como algumas das outras professoras da escola Eastbrook faziam. No entanto, naquele momento, o seu rosto delicado parecia mudado, concentrado com afinco num determinado estudo, e o receio da menina sobrepujou a sua coragem.

Afinal, a senhora Adams já não leccionava na Academia Feminina Eastbrook. Ela tinha saído no final do ano anterior para leccionar história no Colégio Hunua, a escola secundária da região. O facto de ela estar a ajudar no acampamento durante as férias entre o primeiro e o segundo semestre não significava que um dia voltaria a leccionar em Eastbrook. Ela só estava ali porque a velha Carmichael tinha ficado doente e nenhum dos outros professores da escola estava disponível para assumir o seu lugar. A senhora Marshal teria sido obrigada a cancelar o acampamento se não se tivesse lembrado de que a sua amiga e antiga colega morava em Riverview, perto dali. Felizmente, a senhora Adams estava livre e pudera ceder alguns dias do seu tempo. No entanto, certamente não ficaria por perto para aguentar as consequências da escapada daquela noite, e haveria a maior confusão se as outras meninas descobrissem quem as atraiçoara, mesmo que fosse mais por preocupação do que por más intenções.

Segurando o pijama folgado contra o peito, a menina começou a afastar-se em direcção ao corredor escuro, porém já era tarde demais.

Quando Anya virou a cabeça para olhar para outro livro, viu o vulto junto à porta, e surpreendeu-se com a sua própria distracção. Em segundos, o coração acelerou-se, considerando a possibilidade de haver um intruso na casa.

Ela não costumava assustar-se, mas sabia que o parque de campismo ficava perto de uma região relativamente isolada, junto à reserva, e que estava sozinha para proteger quatro adolescentes. Cathy Marshall, a professora encarregada de supervisionar o acampamento, tinha saído com as outras meninas, juntamente com um guarda-florestal, para gravarem o som de pássaros durante a noite, na parte da reserva mantida pelo Departamento de Conservação.

O coração de Anya acalmou-se quando reconheceu uma das meninas que estava sob a sua responsabilidade temporariamente.

– Olá, Jéssica. O que é que estás a fazer? – olhando para o relógio dourado no seu pulso, Anya viu que já passava da meia-noite. Aproveitara-se do silêncio da casa para fazer algumas pesquisas que planeara fazer durante os feriados, mas que não conseguira, pois o tempo passara mais depressa do que imaginara.

– Eu… ah… – Jéssica engoliu em seco, incomodada.

– Não consegues dormir? – perguntou Anya em voz baixa. – O teu estômago está a doer outra vez?

Jéssica e a sua companheira de quarto tinham passado mal após comerem frutas silvestres em excesso.

– Não… Eu só desci para… para… – confusa, mordeu o lábio inferior e olhou à sua volta, procurando por inspiração. – Vim beber água – afirmou, pouco convincente.

Anya resolveu ignorar a mentira tão evidente.

– Entendo. Bem, do que é que estás à espera? – com um gesto de cabeça, indicou a porta da cozinha. – Serve-te.

Voltando a concentrar-se nos livros, ouviu quando a menina acendeu a luz da cozinha, e, após uma pausa, abriu a porta do armário onde guardavam os copos. Depois de outro longo silêncio, a menina apagou a luz e caminhou devagar, parando outra vez na porta da sala de jantar.

Anya ergueu as sobrancelhas e olhou para a menina, perguntando:

– E então? Queres mais alguma coisa? – ainda estava com a mente voltada para a sua pesquisa.

A impaciência no tom de voz de Anya fez com que Jéssica se apressasse a negar com um movimento da cabeça. No entanto, os dedos ainda torciam nervosamente o tecido do pijama. Anya procurou ficar calma e colocou a caneta de lado.

– Tens a certeza? – insistiu, sorrindo com simpatia, afastando a imagem agressiva. – Se não consegues dormir, talvez queiras ficar aqui comigo e conversar um pouco? – sugeriu.

– Bem… – começou ansiosa, porém insegura.

– Há algum problema com as outras meninas?

– Não! – gritou, surpreendida por Anya ter adivinhado. – Quero dizer, não, obrigada. Está tudo bem! Eu… estou a ficar com sono. – fingiu estar a bocejar. – Uh… boa noite, senhora Adams… – virou-se e subiu a escada a correr.

Anya pegou na caneta novamente e tentou voltar a sua atenção para a pesquisa. No entanto, a lembrança do rosto ansioso de Jéssica perturbou a sua consciência. Lamentou-se por não se ter mostrado mais disponível desde o início, pois a sua indiferença causara a perda da confiança da menina. Anya era conhecida como uma grande professora, e um dos seus maiores talentos era ganhar a confiança e o respeito dos seus alunos. Tinha sido graças aos elogios da directora da Academia Eastbrook que Anya conseguira o novo emprego, e depois de aceitar ceder alguns dias das suas preciosas férias para ajudar a cuidar do acampamento, o mínimo que poderia fazer seria corresponder plenamente às expectativas.

Anya também tinha sido aluna daquela escola e sabia das discussões, crueldades e intrigas que podiam acontecer sem o conhecimento da directoria. Lembrando-se de algumas peripécias do passado, Anya sentiu-se ainda mais culpada e afastou a cadeira, arrumando os papéis e os livros numa pilha organizada para depois os guardar na sua pasta. Na verdade, já estava na hora de ir dormir. O dia seguinte seria o último dia do acampamento e tinham planeado muitas actividades, desde o início do dia até à hora em que subiriam para o autocarro para voltarem para a escola. Então, Anya teria liberdade para voltar à paz da sua casa. Após vários anos a morar com outras pessoas, ela adorava a liberdade da independência total, e os últimos dias de convivência em comunidade serviram para confirmar a sua crença de que fizera a coisa certa, decidindo morar sozinha.

Os amigos e familiares acharam loucura ela mudar-se para South Auckland, assumindo a hipoteca juntamente com o novo emprego; no entanto, com vinte e seis anos, Anya achava que estava na hora de ter o controlo da sua vida. Desde criança sonhava em morar no campo, e, como adulta, tinha o poder de transformar o sonho em realidade.

Ela levou a sua pasta até ao pequeno aposento no andar superior, que compartilhava com Cathy, antes de ir, em silêncio, até ao quarto das meninas. Fez uma pausa na entrada do primeiro quarto, lendo a plaqueta na qual estava escrito o nome das meninas que dormiam ali.

Cheryl e Emma.

A sua intuição avisou-a que teria problemas.

Cheryl Marko e Emma Johnson eram uma dupla maçadora de meninas mimadas que tinham deixado claro estarem ali porque o acampamento era obrigatório para as alunas. Elas deveriam ter ido com as outras meninas para o passeio nocturno de observação aos pássaros. No entanto, Cathy permitiu que ficassem para trás quando, coincidentemente, ambas manifestaram uma forte cólica menstrual no mesmo momento.

Nesse instante, pensava Anya, parecia muita coincidência ter dado analgésicos às meninas que estavam deitadas nas suas camas, enquanto as demais saíam para o passeio.

Anya abriu a porta com cuidado e espreitava para dentro do quarto escuro. A lua cheia iluminava o ambiente através das cortinas das janelas, revelando dois vultos inertes sobre as camas.

Tranquilizada, Anya estava prestes a afastar-se quando hesitou e olhou com um pouco mais de atenção. Para duas adolescentes obcecadas por moda e que se gabavam constantemente dos seus corpos esculturais, elas pareciam estranhamente gordas!

Devagar, Anya entrou no quarto, aproximou-se da primeira cama e afastou o cobertor, descobrindo um rolo de roupas com etiquetas famosas e toalhas. Com um olhar rápido à segunda cama, Anya encontrou o mesmo resultado.

Ela sentiu um nó no estômago. Evidentemente, era possível que Cheryl e Emma estivessem do lado de fora, em alguma escapada inocente de adolescentes. No entanto, ela tinha o mau pressentimento de que os seus gostos sofisticados não ficariam satisfeitos com um simples passeio nocturno pelos jardins ou com brincadeiras inofensivas pelos outros quartos.

Uma rápida busca nos quartos vazios não revelou nenhum sinal da dupla, e, apegando-se à esperança de que os seus instintos estivessem enganados, Anya abriu a última porta e chamou:

– Meninas?

Jéssica sentou-se na cama no mesmo instante, ainda com os óculos no nariz, enquanto, na cama ao lado, uma menina ruiva e rechonchuda se virou, pestanejando diante da luz, lutando para se manter acordada.

– Cheryl e Emma desapareceram – afirmou Anya. – Vocês sabem onde é que elas foram? – fixou os olhos no rosto da menina ruiva. – Kristin? Tu és amiga das duas. Elas comentaram o que pretendiam fazer?

– Estava a sentir-me tão mal hoje à tarde, senhora Adams, que não dei atenção a nada do que os outros diziam – respondeu com voz fraca.

Anya não se deixou enganar pela voz de vítima da menina, nem estava de bom humor para uma longa sessão de perguntas e respostas.

– Que pena! – suspirou. – Pretendia cuidar da situação sozinha, mas acho que não tenho escolha. É melhor vocês trocarem de roupa. A polícia, provavelmente, irá querer falar convosco…

– A polícia? – repetiu Jéssica, assustada.

– Mas… mas… Você não deveria esperar mais um pouco antes de fazer alguma coisa? – sugeriu Kristin. – A senhora Marshall esperaria, se estivesse aqui. Elas devem voltar logo, de qualquer maneira…

– Não posso assumir o risco com a praia e o rio tão perto – afirmou Anya, decidida. – Se eu ainda fosse professora do colégio, seria uma situação diferente, mas sou apenas uma ajudante no acampamento. Não posso ficar sem fazer nada, não posso omitir-me neste caso. Felizmente, temos o telefone dos pais delas.

Aquela foi, sem dúvida, uma jogada de mestre.

– Os pais delas? – Kristin ficou horrorizada, com o rosto quase tão vermelho como a cor dos seus cabelos. – Não pode telefonar para o pai de Cheryl. Ficará furioso! Elas só foram a uma festa!

– Uma festa? – o coração de Anya pareceu falhar uma batida. – Que festa? Onde?

Os factos que, relutantemente, foram sendo relatados não eram nada animadores. Um grupo de rapazes da região estava a jogar à bola na praia naquela tarde e convidaram-nas para uma festa na casa de um deles. Cheryl e Emma, as únicas suficientemente ousadas para aceitarem o convite, combinaram serem apanhadas do lado de fora do portão do Parque Regional às dez horas por um dos rapazes no seu carro. Eles tinham prometido que as trariam de volta na hora em que elas quisessem sair da festa.

– Queres dizer que concordaram em sair num carro com estranhos? – perguntou Anya, horrorizada. Tentou lembrar-se das pessoas que vira na praia. Notara vários rostos familiares de alunos da sua nova escola, e garantira a Cathy que os rapazes não faziam parte de nenhum grupo de arruaceiros.

– Não, claro que não! – até mesmo Kristin sabia a diferença entre imprudência e estupidez. – Não fique preocupada, senhora Adams, porque Emma conhecia alguns rapazes que tocaram numa banda na nossa escola!

Anya olhou para cima. Era difícil controlar os hormonas e as ilusões dos adolescentes!

O último susto foi descobrir que a maior atracção da festa era a ausência da supervisão de qualquer adulto.

– Emma disse que o rapaz mais bonito, o dono da festa, contou que seria uma grande diversão, pois a casa seria só dele durante todo o fim-de-semana – acrescentou Jéssica.

Quando pressionada, Kristin foi vaga na exacta localização da festa.

– Os rapazes disseram que demorariam apenas dez minutos até à festa. É uma casa grande no outro lado de Riverview…

– Uma casa branca no alto da montanha, com uma ponte perto do portão e uma fila de pinheiros – acrescentou Jéssica, cuja memória era tão afiada quanto o seu intelecto.

Anya sentiu a boca subitamente seca e ficou alarmada.

– Pinheiros? – perguntou, não conseguindo ocultar o seu espanto com a voz. – A casa é conhecida como «Os Pinheiros»?

– Sim, isso mesmo – concordou Kristin.

– Vocês têm a certeza de que não haveria nenhum adulto na festa?

Kristin concordou, e ficou contrariada, dez minutos mais tarde, sentada no banco de trás do carro de Anya.

– Não entendo porque é que nós precisamos de ir. Não somos nós que nos metemos em encrencas.

– Vêm porque ninguém atende o telefone na casa onde está a acontecer a festa e não as deixarei sozinhas aqui enquanto vou buscar Cheryl e Emma – explicou Anya, procurando, no porta-luvas, os óculos que usava para conduzir, e depois manobrou o carro para fora do estacionamento. Deixara um bilhete explicando a situação para Cathy, apesar de achar que estaria de volta antes que o grupo regressasse da sua excursão.

Anya apertou o volante ao entrar na estrada que conduzia à mansão, o caminho principal que ligava a costa aos arredores de South Auckland, enquanto tentava acalmar-se. Provavelmente, estava a exagerar. Na verdade, ela própria já tinha participado numa ou duas festas sem permissão, pois era praticamente um ritual entre os alunos mais velhos, e até mesmo uma pessoa tão séria como ela tinha sido obrigada a desrespeitar algumas regras para poder ter uma convivência pacífica com as colegas.

O problema era que após quatro meses da sua saída do Colégio Eastbrook, Anya acostumara-se a não se preocupar com o que os alunos faziam depois do horário das aulas. Uma das razões pela qual gostava de leccionar no Colégio Hunua era que havia uma clara separação entre trabalho e lazer. Quando saía da escola, deixava as suas responsabilidades no portão. Ela levava trabalhos para corrigir em casa, mas não era pessoalmente responsável pelo bem-estar das crianças, até ao início do dia seguinte.

– E se elas já tiverem saído quando chegarmos lá? – perguntou Jéssica, de repente. – E se elas voltarem por outro caminho e nos desencontrarmos?

– Esta é a única estrada de Riverview para o Parque Regional – informou Anya. – Além disso, há pouco trânsito a esta hora da madrugada, portanto, perceberemos se elas passarem por nós. Por outro lado, Cheryl e Emma disseram a Kristin que voltariam por volta das duas horas da manhã, portanto ainda devem estar lá.

– A não ser que a festa tenha sido uma invenção dos rapazes, e todos tenham ido a outro lugar – sugeriu a menina, timidamente.

Anya rilhou os dentes. Como se não estivesse suficientemente preocupada!

– Vamos pensar nessa possibilidade depois, está bem?

Ela continuou a conduzir em silêncio, tensa. Felizmente, a noite estava clara, apenas com a dança suicida dos mosquitos em redor dos faróis para distrair a atenção de Anya. Os campos ao lado da estrada tinham a mesma coloração, e, de vez em quando, a luz amarela de alguma casa de campo surgia entre as árvores, ou sobre alguma colina.

Já estavam a caminho há mais de quinze minutos, seguindo à velocidade permitida, até que Anya chegou ao conjunto de lojas e casas que formavam a pequena cidade de Riverview.

Ela diminuiu a velocidade, e nem sequer olhou na direcção da sua casa, que ficava do lado da estrada, num enorme jardim que se tornara o seu grande desafio e prazer particular. Antes de ser matriculada na escola, Anya passara a infância numa sucessão de quartos de hotel e apartamentos, e a coisa mais parecida que tivera com um jardim tinha sido um vaso de plantas.

Elas passaram pelo único posto de gasolina da cidade, que já tinha as luzes apagadas e as bombas trancadas. À medida que as construções davam lugar a pastagens e cercas, Anya acelerou o carro, ansiosa por resolver o problema com as duas alunas fugitivas. Esperava que Cheryl e Emma tivessem o bom senso e cooperassem quando as levasse de volta ao acampamento. Esperava que tudo acontecesse da forma mais pacífica possível, de preferência sem cenas dramáticas que pudessem trazer-lhe mais problemas.

Anya não suportava a ideia de lidar com duas adolescentes mal-educadas, e talvez bêbedas, e muito menos com uma festa repleta de jovens rebeldes. Apesar de ser magra e considerar-se forte, tinha pouca altura, apenas um metro e sessenta centímetros, e, normalmente, os seus alunos mais velhos eram mais altos, fazendo-a usar de inteligência, bondade e bom humor para lhes ganhar o respeito, ao invés de se impor pela presença física.

Anya ficou ainda mais tensa ao fazerem a curva na estrada e entrarem na rua cercada de pinheiros que subia para o alto da colina. Mesmo esperando a visão familiar, o coração disparou.

– Chegámos? – a pergunta excitada de Jéssica foi redundante, pois Anya diminuía a velocidade, enquanto o pequeno carro vibrava com o contacto dos pneus com as pranchas de madeira da ponte sobre o riacho, na entrada da propriedade.

No fim de uma bela rua, cercada de árvores frondosas, podiam ver a enorme mansão branca, as luzes coloridas atrás das cortinas do primeiro andar. Mesmo com as janelas do carro fechadas, ouviam o som alto através das paredes.

– Foi por isso que não atenderam o telefone – murmurou Anya, estacionando atrás da fila de carros, em redor do círculo pavimentado, na frente da casa.

Após hesitar um instante, retirou as chaves da ignição e saiu do carro, inclinando-se para falar com as meninas:

– Vocês devem ficar aqui. Tranquem as portas e não abram para ninguém excepto eu, Cheryl ou Emma. Voltarei assim que puder. Não fiquem impacientes se tiverem de esperar um pouco, e não saiam do carro!

Explicando as suas exigências com veemência, Anya bateu a porta do carro e trancou-a, colocando as chaves no bolso das calças, os óculos no bolso da camisa, e caminhando apressada até à porta da mansão.

Tocar à campainha de nada adiantara. Frustrada, bateu à porta e ainda assim não foi atendida. Então, girou a maçaneta dourada e descobriu que a porta estava aberta. Empurrou-a devagar e entrou, sentindo o som ensurdecedor.

Havia pouca dúvida de que viera ao lugar certo. Estava realmente a haver uma grande festa!

Havia jovens por toda a parte, dançando ao ritmo da música, encostados contra a parede, sentados sobre a mobília e no chão; alguns estavam abraçados, outros conversavam do modo como o barulho permitia. Garrafas, latas, copos e restos de salgadinhos e pizzas pareciam ocupar cada centímetro dos móveis. A atmosfera estava pesada com o fumo de cigarros e a combinação de perfumes, cerveja e suor.

Anya andou de sala em sala, procurando pelos cabelos loiros de Cheryl e o vestido preto que Kristin dissera que Emma usava, e tinha muita dificuldade em identificá-las, devido às luzes vermelhas e roxas.

Finalmente, viu uma figura conhecida no canto de um sofá, a ser abordada por um jovem nada atraente. Anya ficou satisfeita ao notar que Emma não parecia estar a divertir-se.

A menina olhou para cima quando Anya se aproximou e o rosto pálido demonstrou surpresa, incredulidade e pânico, além de certo alívio.

– Vem – ordenou Anya, segurando a menina pelo pulso e puxando-a do sofá, ignorando os protestos do rapaz enquanto abria caminho entre a multidão. – Onde é que está Cheryl? – perguntou quando alcançaram a porta da frente, onde o barulho era ligeiramente menor.

Emma mordeu o lábio, desviando o olhar, nervosa.

– Ela foi lá para cima há mais ou menos dez minutos. Ela disse que não nos iríamos separar, mas… mas então ela subiu com um dos rapazes que nos convidou para a festa. Ele disse que o seu nome era Sean.

Anya sentiu um arrepio na espinha e um frio no estômago.

– Jéssica e Kristin estão aí fora, no meu carro. Vai até lá e entra no carro. Agora!

Anya esperou apenas alguns instantes para se certificar de que a menina tinha ido para o carro, antes de se virar e subir a escada a correr, o que não foi fácil, uma vez que havia vários jovens sentados nos degraus.

Ao chegar ao andar superior, Anya parou no átrio principal e olhou para as portas dos quartos, algumas das quais estavam trancadas. Num quarto que estava destrancado, Anya viu um casal entrar, demonstrando as suas intenções no modo como andavam e se abraçavam.

Quando Anya tentou abrir a porta do quarto seguinte, a porta foi aberta, de repente, por uma rapariga de cabelos muito curtos e brinco no nariz. Tinha fones de ouvido pendurados no pescoço e o fio descia até aos pés descalços.

– O que é que quer? – gritou, com as mãos na cintura.

Anya ficou momentaneamente perturbada com a hostilidade dela e respondeu:

– Ah… Procuro Sean – explicou, e foi contemplada com desdém pelos olhos azuis da rapariga.

– És um pouco velha para ele, não achas? – insultou-a, indicando outra porta com a cabeça. – O quarto dele fica no fim do corredor, mas o idiota já está bêbedo demais para te poder fazer algum bem!

A rapariga fechou a porta tão rapidamente como tinha sido aberta e Anya tentou recuperar-se de um encontro tão sinistro, correndo logo a seguir até à porta indicada.

Empurrou a porta, que estava destrancada, e, pela fresta, viu Cheryl ajoelhada ao lado de uma cama de solteiro, os lábios sem batom, as roupas amassadas, mas felizmente ainda no corpo da menina. Ao lado dela, na cabeceira da cama, sentava-se um rapaz sem camisa, usando calças de ganga, pendendo para um lado enquanto bebia de uma garrafa de vodca.

Sean Monroe era um dos astros da equipa de futebol do Colégio Hunua e tinha um belo físico para provar a sua fama. Mesmo tendo apenas dezassete anos, os ombros largos e o peito musculoso pareciam mais condizentes com um adulto do que com um rapaz. No entanto, a expressão amuada que apareceu no seu rosto ao ver Anya demonstrava que ainda tinha muito a aprender.

Os dois conheciam-se apenas de vista, já que ele não estava matriculado em história, mas Anya preferia não o ter conhecido daquela maneira. Ele nunca lhe perdoaria por ter estragado a sua diversão.

se para o rapaz deitado na cama, pretendendo despejar a sua ira com algumas palavras sobre o comportamento dele.

– Percebes como te estavas a arriscar? Aquela menina é menor de idade… – começou, irritada.

Sean gemeu e, de repente, levantou-se de um salto, quase derrubando Anya ao correr para outra porta. Não se importando com a falta de educação do rapaz, Anya correu atrás dele, percebendo tarde demais que o seguira até à casa de banho.

Quando ele se ajoelhou e vomitou no vaso sanitário, ela sentiu um pouco de compaixão, e encheu um copo de água para dar a Sean quando ele terminasse. Quando ele finalmente se pôs em pé e tomou alguns goles da bebida, imediatamente ficou enjoado de novo, e Anya não foi suficientemente rápida para se afastar e evitar que a sua blusa e uma perna das suas calças ficassem sujas.

Prendendo a respiração, Anya limpou a blusa com uma toalha, enquanto Sean limpava a boca e, visivelmente bêbedo, saía cambaleando para o quarto. Aborrecida consigo mesma pela sua compulsão por limpeza, pegou noutra toalha e limpou a sujeira do chão da casa de banho.

Anya estava a ficar enjoada com o cheiro das suas roupas. Não poderia sentar-se no pequeno carro com aquele cheiro horroroso, pois ela e as meninas acabariam por vomitar também!

Observando pela porta da casa de banho, verificou que Sean estava estirado sobre a cama. Fechou a porta e tirou as roupas sujas. Molhou a blusa na água fria e esfregou o tecido com sabonete. O pano molhado seria desconfortável colando na sua pele, mas seria melhor do que sentir o cheiro de vómito!

Ela estava prestes a torcer a roupa para tirar o excesso de água quando ouviu um barulho de qualquer coisa a cair no chão e gemidos do outro lado da porta. Temendo que Sean pudesse estar a passar mal outra vez, pegou numa camisa masculina que estava pendurada na casa de banho, a única peça de roupa seca à vista, vestiu-a apressada e correu para o quarto.

Anya ficou contrariada ao ver Sean a procurar pela garrafa de bebida que de algum modo derrubara no chão.

– Ah, ah! – exclamou ele, erguendo a garrafa, mal conseguindo focar os olhos em Anya, que se aproximou, usando apenas uma camisa, e lhe tirou a bebida das mãos.

– Ficarei com isto – afirmou, pretendendo esvaziar a garrafa no lavatório da casa de banho.

– De jeito nenhum, vadia! – ele agarrou-a, tentando pegar na bebida. Anya girou o braço e afastou-se. Ele contorceu o corpo, tentando dominá-la, e, durante alguns segundos, ficaram colados num tipo estranho de dança na beira da cama que terminou de repente com um grito forte e indignado:

– Que chatice, Sean. Pensei que tivéssemos concordado que não darias nenhuma festa enquanto eu estivesse a viajar. Que é que está a acontecer aqui?

Anya virou-se e o homem parado na porta do quarto ficou tenso, com os olhos azuis a demonstrarem a sua surpresa.

– Você!

O modo como a palavra foi pronunciada deixava evidente a acusação implícita, e Anya ficou gelada, com a sua vida inteira a passar diante dos seus olhos. Ela segurou a camisa semi-aberta e olhou para o tio de Sean Monroe, que supostamente deveria estar a viajar.

Scott Tyler, o demónio da vida dela.

O homem que se opusera firmemente à contratação de Anya no Colégio Hunua. O conselheiro legal da escola que achava que ela não era competente para fazer o trabalho que tanto amava. O homem que admitira que estava apenas à espera que ela cometesse um erro para provar que ele tinha razão!